A Iniciativa Caminhos da Semente, sob a coordenação da Agroicone e do Instituto Socioambiental (ISA), realizou entre os dias 11 e 14 de setembro a primeira edição da Expedição Restauração e Redes de Sementes no estado de São Paulo. Percorrendo mais de 2.700 km e reunindo cerca de 100 representantes de órgãos governamentais, organizações da sociedade civil, empresas, pesquisadores e agentes da cadeia da restauração, a Expedição teve o propósito de divulgar o método da semeadura direta fomentando a troca de experiências entre diferentes elos da cadeia da restauração ecológica.
Também conhecida como muvuca, a semeadura direta consiste no plantio de uma mistura de sementes de espécies nativas como método de recomposição de florestas ou outros ecossistemas. Ao longo da Expedição – composta por três rotas que partiram de maneira simultânea do Vale do Ribeira, Vale do Paraíba e Noroeste Paulista – foram visitadas 13 áreas restauradas por meio da semeadura direta, com diferentes idades e estágios de desenvolvimento. Ao final da experiência, todos os participantes se encontraram em São Carlos, na Fazenda Santa Maria do Monjolinho, para conhecer florestas restauradas há mais de dez anos e um plantio coletivo de muvuca de sementes.
Para Laura Antoniazzi, pesquisadora sênior e sócia da Agroicone, ao apostar na conexão entre diferentes pessoas e organizações presentes em cada rota, a Expedição conseguiu enfatizar os benefícios socioeconômicos e ambientais da muvuca de sementes: “A semeadura direta é um método de restauração inclusiva e, por imitar a regeneração natural, é replicável em vários ecossistemas, possuindo um ótimo custo-benefício. Então por que não é mais conhecida? Essa foi a nossa proposta com a Expedição e fizemos isso valorizando a importância de cada ator da cadeia da restauração, desde o coletor de sementes até as grandes empresas que financiam e acreditam no método”, afirmou.
Para destacar a variedade de experiências no estado, os técnicos da Iniciativa Caminhos da Semente elaboraram, de maneira colaborativa com redes de coletores de sementes, organizações parceiras e proprietários rurais de cada região, três rotas com características e destaques distintos de modo a atrair um público amplo e diversificado.
Rota do Vale do Ribeira
Crédito da foto: Nathalia Marangoni/Agroicone
“A frase ‘Meio ambiente com gente’ é uma reivindicação que eu ouço muito aqui nas comunidades do Vale do Ribeira e que descreve perfeitamente a experiência dessa rota”, afirmou a professora e pesquisadora da UNESP de São José dos Campos, Klécia Massi, uma das participantes da Expedição, sobre o fato de a Rota do Vale do Ribeira ter como característica marcante a ênfase a aspectos sociais da cadeia da restauração ecológica.
Logo no início da rota, os participantes almoçaram no Quilombo Nhunguara, em Eldorado, e conheceram de perto as experiências dos coletores de sementes da região, que integram a Rede de Sementes do Vale do Ribeira, hoje formalizada como cooperativa. A coleta de sementes é uma importante atividade econômica na região e contribui para complementar a renda de muitos que vivem nas comunidades quilombolas de Nhunguara e André Lopes. Perto do quilombo, os participantes também conheceram a Casa de Sementes Jucão, uma construção à base de barro onde são armazenadas, em um ambiente climatizado, as sementes coletadas pelos quilombolas. No local, eles aprenderam sobre técnicas de armazenamento e participaram de uma atividade de limpeza de sementes.
Em Pilar do Sul, foram visitados os viveiros do Instituto Refloresta, onde aconteceu uma roda de conversas sobre produção de sementes. Três áreas de plantio mecanizado foram visitadas ao longo da rota: em Boituva, no Sítio São Francisco, o método foi realizado a lanço; em Cajati o destaque ficou para a parceria firmada entre o setor público, a iniciativa privada e ONGs para garantir a restauração de uma área dentro do Parque Estadual do Rio Turvo, uma Unidade de Conservação; e em Itirapina (Fazenda da Toca) a semeadura foi aplicada em linhas, sem o uso de herbicidas.
Uma experiência bastante elogiada pelos participantes da rota foi a visita ao Laboratório de Sementes e Mudas Florestais (LASEM) no Campus Sorocaba da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), onde puderam aprender junto à professora Fatima Piña-Rodrigues sobre os diferentes métodos de testagem utilizados para a análise de sementes.
Rota do Vale do Paraíba
Crédito da foto: Andréia Vital/JornalCana
Os morros e várzeas que delineiam a paisagem do Vale do Paraíba são importantes para entender o panorama da restauração ecológica na região, pois ao mesmo tempo em que apresentam desafios, também oferecem uma série de oportunidades para a implementação da semeadura direta. Nesta rota, os participantes puderam conhecer os diferentes contextos em que o método foi empregado na região, tanto em fazendas, sítios e assentamentos, como também em uma usina e com parcerias governamentais.
Um dos destaques foi a visita ao Assentamento Conquista, em Tremembé, onde os participantes visitaram áreas de plantio em linhas sem herbicidas e participaram de uma oficina de beneficiamento de sementes junto à Rede de Coletores do Vale do Paraíba. Um momento marcante foi quando um dos participantes da rota, Amilton Rosa de Santana, que veio do Espírito Santo representando a Rede de Sementes Tupyguá, ficou surpreso ao avistar um guapiruvu em uma das áreas. Sabendo que as sementes da sua rede foram comercializadas na região, ficou feliz em saber que a existência daquela árvore pode ter sido fruto de seu trabalho como coletor de sementes junto ao seu coletivo.
Na Usina São João, em Araras, os participantes conheceram uma das experiências mais antigas de semeadura direta do estado, com cerca de 13 anos. Em Cruzeiro, visitaram áreas de semeadura direta em áreas planas e declivosas de 2 a 6 anos e conhecerem a Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), que desenvolve pesquisas voltadas para a agricultura e é uma grande parceira da Iniciativa Caminhos da Semente.
Rota do Noroeste Paulista
Crédito da foto: Paulo César de Souza Filho/Instituto Araribá
A Rota do Noroeste Paulista se diferenciou das demais pela ênfase na restauração ecológica em grandes propriedades, com ambição de implantar em larga escala. Os participantes visitaram três propriedades com canaviais onde o método foi empregado: a Fazenda Cruz Alta, em Olímpia (do grupo Tereos), a Usina Santa Isabel, em Adolfo, e a Fazenda Santa Maria do Monjolinho, em São Carlos. Só em Olímpia e Adolfo, 39 hectares estão sendo restaurados com a técnica da muvuca. De acordo com Matheus Rezende, técnico em restauração ecológica no Instituto Socioambiental (ISA), foram observados resultados positivos no desenvolvimento das árvores nativas dois anos após o plantio.
Em entrevista ao Diário da Região, Samuel Campoy, engenheiro ambiental da Usina Santa Isabel, afirmou que a técnica da semeadura direta em áreas próximas a plantações de cana tem sido um recurso importante para a recomposição da vegetação nativa. “É uma técnica muito interessante, pois é fácil de plantar, exige menos mão-de-obra, tem um custo inferior ao das mudas e o trabalho de plantio é mais rápido”.
Além das propriedades com canaviais, o grupo também visitou um assentamento da agricultura familiar em Promissão e conheceu a Zé da Lena Sementes, empreendimento de sucesso gerido pelos coletores de sementes José Severina da Silva e sua filha Gisele Silva Santos. Depois de terem se credenciado como coletores, eles agora comercializam sementes nativas para o Redário, organização parceira da Iniciativa Caminhos da Semente, além de vender para viveiros, provando que a semeadura direta e a geração de renda podem caminhar juntas.