Síntese da Agroicone sobre a COP30

A COP30 encerrou no dia 22 de novembro em Belém, mostrando que, mesmo em um cenário geopolítico complexo, o multilateralismo permanece vivo. A presença de mais de 190 países demonstra que a cooperação internacional segue como caminho viável.

A decisão do Mutirão Global reconheceu o multilateralismo como base para ampliar ações de mitigação e adaptação alinhadas à meta de 1.5ºC, marcando a transição para uma fase de implementação.

Financiamento

A agenda de financiamento – historicamente tida como o calcanhar de aquilhes das negociações – saiu fortalecida. As Partes concordaram em triplicar os recursos para adaptação até 2035, com liderança dos países desenvolvidos.

A decisão do Mutirão trouxe desdobramentos importantes da Nova Meta Coletiva Quantificada de Financiamento (NCQG), adotada na COP29, incluindo:

  • Convocação de uma mesa redonda ministerial de alto nível para refletir sobre a implementação da NCQG;
  • Criação de um programa de trabalho de financiamento climático, com foco na mobilização de pelo menos US$ 300 bilhões anuais provenientes de países desenvolvidos.

O Roadmap Baku – Belém, que orienta a trajetória para alcançar a meta de US$ 1.3 trilhão anuais, foi notado pelas Partes e deve orientar os trabalhos futuros. Entre os temas que devem ganhar peso estão o papel crescente dos bancos multilaterais de desenvolvimento e do setor financeiro privado; a criação de plataformas nacionais; e o desenvolvimento de instrumentos financeiros inovadores.

Implementação de ações de mitigação e adaptação

Como “COP da implementação”, Belém propôs uma reformulação da Agenda de Ação e introduziu duas iniciativas voltadas à implementação efetiva do Acordo de Paris.

O Acelerador Global de Implementação visa apoiar os países na implementação das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) e Planos Nacionais de Adaptação (NAPs). Ele incluirá com um relatório focado em priorizar ações com maior potencial de escala, que será produzido em conjunto pelas Presidências da COP 30 e COP 31, com entrega prevista para o fim de 2026.

Com um mandato semelhante, a Missão de Belém para 1.5ºC busca mesclar implementação de ações climáticas com o fortalecimento da cooperação internacional e a captação de investimentos. As Presidências da COP 29, COP30 e COP31 serão responsáveis por elaborar um relatório a ser apresentado na COP31.

A evolução e o sucesso desses novos instrumentos dependerão do engajamento das Presidências e das Partes envolvidas na identificação de soluções concretas para apoiar ações de mitigação e adaptação. Cria-se, a partir da COP30, um novo momento para evoluir tendo essas iniciativas como base, o que sugere que 2026 será um ano intenso para construir caminhos a partir dessas iniciativas.

Quanto à Agenda de Ação, mecanismo que conecta atores externos com as Conferências de Clima, ela foi reestruturada pela Presidência brasileira com base na decisão do Balanço Global (GST). Diversas iniciativas voluntárias foram organizadas em seis grandes eixos, com o objetivo de monitorar o progresso para além das negociações formais.

Comércio internacional

Pela primeira vez na história das COPs, foi adotada uma decisão relacionada a medidas comerciais unilaterais, visando evitar a adoção de políticas climáticas que resultem em discriminação injustificável e arbitrária ao comércio internacional. A decisão do Mutirão Global criou mandato para que as Partes discutam as relações entre comércio e clima nos próximos 3 anos, nas reuniões dos órgãos subsidiários, que ocorrem sempre no mês de junho em Bonn, na Alemanha.

Além disso, o lançamento do Fórum Integrado sobre Mudanças Climáticas e Comércio cria um ambiente para que países, setor privado e organizações internacionais explorem como o comércio pode favorecer a transição para uma economia de baixo carbono, buscando soluções mutuamente benéficas.

Roadmap para se afastar dos combustíveis fósseis

A tentativa de emplacar um roadmap para orientar o afastamento dos combustíveis fósseis não integrava a agenda formal de negociação, tendo sido impulsionada pelo discurso do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na abertura da Cúpula dos Líderes. 

A proposta recebeu apoio de mais de 80 países, incluindo os signatários da Declaração de Belém, mas enfrentou resistência de grandes produtores e consumidores de combustíveis fósseis, como Emirados Árabes Unidos, Índia, China e Rússia.

Apesar de o tema não ter sido incluído nos textos finais, o Presidente da COP30, embaixador André Côrrea do Lago, comprometeu-se a elaborar dois roteiros: um para a transição para longe dos combustíveis fósseis e outro para parar e reverter o desmatamento até 2030.

Como esses relatórios não foram mandatados pela COP nem integram a agenda oficial da UNFCCC, eles possuem caráter informal. Isso gera incertezas sobre como serão recebidos pelas Partes e se conseguirão gerar resultados formais.

Aproveitando o momentum, Colômbia e Países Baixos organizarão uma conferência internacional voltada à transição justa para longe dos combustíveis fósseis em abril de 2026 em Santa Marta, Colômbia.

No âmbito da Agenda de Ação, vale destacar o Compromisso de Belém pelos Combustíveis Sustentáveis (Belém 4x), que busca quadruplicar a produção e o uso de combustíveis sustentáveis até 2035. A iniciativa, endossada por 24 países, será coordenada pela Conferência Ministerial de Energia Limpa (CEM) e deve gerar uma intensa agenda a partir de 2026, voltada para fortalecer o papel dos combustíveis sustentáveis na transição energética global.

Transição justa

Um dos destaques da Conferência foi a criação de um mecanismo de transição justa, voltado à cooperação internacional, assistência técnica, capacitação e troca de conhecimento.

A operacionalização do mecanismo, juntamente com a continuidade do Programa de Trabalho sobre Transição Justa, será discutida em junho de 2026, durante a reunião dos Órgãos Subsidiários em Bonn (SB 64).

O texto adotado reafirma que as transições justas devem estar alinhadas aos objetivos do Acordo de Paris e refletir os contextos e prioridades nacionais de desenvolvimento. 

Meta Global de Adaptação

Em linha com o esperado, a COP adotou medidas para monitorar o progresso global na adaptação às mudanças climáticas, operacionalizando o Framework dos Emirados Árabes Unidos para Resiliência Climática Global.

Dos 100 indicadores inicialmente propostos, 59 foram aprovados pelas Partes. Eles são voluntários, não criam encargos adicionais e não devem servir como condicionalidade financeira.

A decisão também estabeleceu a Visão Belém – Addis, que estabelece um processo de alinhamento político desses indicadores até a COP32, que será realizada em Adis Abeba na Etiópia.

Por fim, foi acordado que o Roadmap de Adaptação de Baku deverá estar alinhado à meta de 1.5ºC do Acordo de Paris, fortalecer a implementação, aprimorar o compartilhamento de experiências e garantir o acesso a meios de implementação.

Agricultura e segurança alimentar

Sem expectativa de decisão na COP30, as Partes avançaram em conclusões prévias sobre o tema, observando o mandato do Grupo de Sharm el-Sheikh para a implementação de ações climáticas em agricultura e segurança alimentar (SJWA), válido até 2026.

O texto inicial reforça que a agricultura deve coexistir com a ação climática e a proteção da biodiversidade, reconhecendo seu papel central para a segurança alimentar global. Também afirma que não há solução única: sistemas agrícolas sustentáveis devem ser ajustados às realidades nacionais e locais.

O tema voltará à agenda na SB 64, em junho de 2026, junto ao segundo workshop do SJWA, que discutirá progresso, desafios e oportunidades relacionados ao acesso a meios de implementação para ação climática em agricultura e segurança alimentar.

A COP31, na Turquia, será um marco decisivo. Nela, as Partes deverão adotar uma decisão sobre os resultados do SJWA e avaliar a continuidade do programa de trabalho. Essa etapa é fundamental para ampliar o compartilhamento de experiências em agricultura de baixo carbono e avançar no Portal online de Sharm el-Sheikh.

No âmbito da Agenda de Ação, destaca-se ainda o lançamento da iniciativa Resilient Agriculture Investment for net-Zero land degradation (RAIZ) pelo Ministério da Agricultura, que será ancorada na FAST Partnership da FAO, com o objetivo de fomentar a cooperação e conectar financiamento a projetos de restauração de áreas degradadas. A iniciativa, apoiada por pelo menos 10 países, será liderada pelo MAPA em parceria com a FAO.

Mercado de Carbono

Mesmo sem negociações formais previstas até 2028, o Artigo 6 esteve no centro das discussões da COP30. O ano se encerra com progressos relevantes para os instrumentos de mercado do Acordo de Paris, incluindo a operacionalização do Artigo 6.4 pelo Órgão Supervisor e o anúncio de novos acordos bilaterais sob o Artigo 6.2.

Ainda assim, permanece a preocupação com a insuficiência de recursos financeiros para sustentar e estrutura dos mecanismos.

Abordagens cooperativas (Artigo 6.2)

A decisão reconheceu o avanço das abordagens cooperativas, com 39 iniciativas reportadas e a conclusão da primeira rodada de revisões técnicas. Porém, chamou atenção para inconsistências nos informes das Partes.

Entre os encaminhamentos:

  • O Grupo de Revisão Técnica deverá explicar de forma mais clara suas constatações e recomendações;
  • Será realizado um diálogo interativo em 2026 para identificar padrões recorrentes.

A decisão também expressou preocupação com o atraso na infraestrutura de contabilidade e registro, solicitando ao Secretariado que acelere sua implementação. Outro ponto de destaque foi o reforço à capacitação, incluindo materiais de treinamento para contabilidade e reporte.

Mecanismo de Crédito do Acordo de Paris (Artigo 6.4)

As Partes analisaram o primeiro relatório do Órgão Supervisor (SBM), que apresentou avanços técnicos, gerando intenso debate sobre o processo de definição de regras, padrões e metodologias.

Diante de preocupações com prazos curtos para contribuições e oportunidade de participação limitada, a decisão:

  • Reforça a necessidade de altos padrões de transparência;
  • Solicita ao Secretariado que amplie e divulgue mecanismos de engajamento,

A Conferência das Partes do Acordo de Paris (CMA) também:

  • Acolheu o relatório anual do SBM;
  • Adotou a primeira metodologia voltada à captura de metano em aterros sanitários;
  • Aprovou cinco padrões essenciais para linha de base, adicionalidade, vazamento, demanda reprimida e não permanência.
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