Usinas brasileiras perdem US$ 581 milhões com política tailandesa para o açúcar

Um dos principais concorrentes na disputa do mercado internacional de açúcar está tirando o sono dos produtores brasileiros. E também uma boa cifra, segundo uma análise realizada pela consultoria Agroícone. A receita das usinas do Brasil na safra 2014/15 teria sido reduzida em nada menos do que US$ 581 milhões.

Isso porque o país asiático tem ampliado sua participação no mercado internacional graças às contribuições do governo para a produção doméstica, o que, na avaliação da consultoria, configura um subsídio cruzado à exportação. Isso coloca a Tailândia em uma condição mais competitiva ao mesmo tempo em que pressiona os preços da commodity para baixo.

Este impacto fez com que o governo do Brasil realizasse, em fevereiro, um questionamento informal à Organização Mundial do Comércio (OMC) quanto à política tailandesa para o açúcar. E o debate tem pautado encontros da Câmara Setorial do Açúcar e Álcool, onde o estudo da consultoria brasileira foi apresentado na semana passada em Brasília.

Segundo a estimativa da consultoria, os estímulos à produção de açúcar levaram a um incremento de 1,86 milhão de toneladas na oferta tailandesa ao mercado externo em 2015/16, na comparação com a safra 2010/11. Essa variação trouxe um crescimento de 3,2% no volume mundial exportado, que totaliza 57 milhões de toneladas em açúcar equivalente bruto.

“Isso levaria, de acordo com estimativas preliminares nossas e consultas a operadores de mercado, a um decréscimo de preço, no mínimo, de 6,4%, ou seja, ao redor US$ 24,2/ton. Essa redução significaria uma perda de receita para o Brasil de US$ 581 milhões (assumindo exportações de 24 milhões de toneladas com preços US$ 24,2/ton mais baixos)”, explicou a Agroícone na apresentação da Câmara Setorial, do Ministério da Agricultura.

A política tailandesa é atualizada a cada ano e para 2015 ainda não existe uma definição, mas o lobby das açucareiras para garantir o benefício já está em andamento, segundo informou ao novaCana a pesquisadora sênior da Agroícone, Luciane Chiodi, e uma das responsáveis pelo estudo discutido na Câmara Setorial.

No entanto, Chiodi pontua que o Cane Sugar Fund, que financia os produtores, já está bastante endividado e precisaria da intervenção do banco estatal para bancar o subsídio, já que o fundo vem arrecadando menos do que paga aos produtores.

Comprovação

A análise considera que a combinação entre pagamentos diretos ao produtor de cana, preços mínimos fixos e oferta controlada de açúcar no mercado interno indicam que o crescimento das exportações tailandesas se deu por políticas de estímulo.

“Isso caracteriza que tais políticas são distorcivas ao mercado internacional e estão causando danos aos demais exportadores por contribuírem para a redução dos preços internacionais”, reclama a Agroícone. Na leitura dos especialistas, a Tailândia está violando três artigos de acordos internacionais de comércio.

Análise da Unica ao governo brasileiro foi mais taxativa e afirmou que “caracterizado o subsídio cruzado comprova-se que os preços garantidos no mercado doméstico atuam como subsídio à exportação, colocando a Tailândia em situação ilegal na OMC”.

Como funciona o subsídio

Na etapa agrícola o governo controla o preço da cana-de-açúcar e garante um valor mínimo ao produtor de US$ 28 por tonelada, com isso as usinas deixam de ser impactadas pelo aumento do custo da matéria-prima. Segundo dados da Unica apresentados ao governo brasileiro, em 2013 e 2014 cerca de 20% do valor pago pela cana veio diretamente do fundo.

A Agroícone calcula que no mesmo período o pagamento direto feito pelo governo aos produtores de cana-de-açúcar tenha ficado na faixa de US$ 5 por tonelada de cana-de-açúcar.

(Fonte – várias fontes. Elaboração – Agroicone)

 

Para garantir o abastecimento doméstico, o governo também fixa cotas de açúcar com preço mínimo. Em novembro do ano passado, enquanto o mercado mundial pagava 18,4 centavos de dólar por libra-peso (cents US$/lb) de açúcar, no mercado interno a remuneração do produtor chegava 28 cents US$/lb.

O preço era composto por 19,3 centavos de dólar por libra-peso, sobre os quais incidiam mais 8,7 centavos, referentes a taxa recolhida para financiar o fundo e o Bank for Agriculture and Agricultural Cooperative (BAAC).

Ainda tomando por base novembro de 2014, a consultoria estimou que o os subsídios cruzados à exportação de açúcar alcançavam US$ 7/ton no período, cobrindo 74% do adoçante produzido pelo país. Assim, o estímulo à exportação é garantido indiretamente pelos 26% do açúcar ofertado internamente.

Elaboração: Agroicone

 

Adicionalmente, lembra Luciane Chiodi, o governo concede financiamento com baixa taxa de juros a fornecedores e usinas para compra de máquinas.

Os efeitos sobre a oferta mundial

Enquanto a participação do Brasil nas exportações mundiais de açúcar caiu 5,3% somente nas últimas três safras, a Tailândia incrementou em 3,7% sua participação no comércio mundial da commodity durante o mesmo período.

Fonte: USDA, FAO, FO LICHTS. Elaboração: Agroicone

 

O país asiático exportava 6,6 milhões toneladas de açúcar na safra mundial 2012/13 e, nesta safra, deve enviar para o exterior 8,5 milhões toneladas de açúcar, segundo estimativa da Agroícone.

Fonte: USD. Elaboração: Agroicone

 

Ampliando a análise para as últimas cinco safras, de 2010/11 a 2014/15, a exportação total cresceu 28%. No mesmo período, o consumo doméstico variou 13%, para 2,7 milhões de toneladas, e o estoque doméstico subiu 29%, para 3,8 mil toneladas.

O crescimento foi viabilizado pelo aumento de 20% na área plantada, que atualmente chega a 1,5 milhão de hectares.

O arroz vai virar cana

O governo estimula ainda a conversão de áreas de arroz em plantações de cana-de-açúcar. A Unica aponta que, segundo o sistema de zoneamento do governo tailandês, até a safra 2017/18 deve ocorrer a conversão de 300 mil hectares em canaviais.

A mudança dessas áreas de arroz para o plantio de cana resultaria na produção de mais 2,4 milhões de toneladas de açúcar, aumentando o excedente para venda no mercado externo.

Autor: Amanda SchArr – novaCana.com

 

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